Evanildo da Silveira
Para começar, aquela famosa maçã inglesa teria caído na cabeça de Newton com sua força reduzida em duas vezes e meia. Será que assim ele teria dado menos importância ao fato, atrasando a descoberta da Lei da Gravidade? Bem, nem perca tempo pensando nisso: não há nenhuma comprovação histórica de que o episódio da maçã tenha realmente ocorrido. O certo é que se, de uma hora para outra, o nosso planeta passasse a ter uma força gravitacional igual à de Marte – 3,7 m/s2 contra os atuais 9,8 m/s2 –, toda a vida terrestre caminharia para a extinção.
Pouco a pouco, iríamos literalmente ficando sem ar. “Os gases da alta atmosfera escapariam da gravidade da Terra e se espalhariam pelo Universo”, diz o físico Odylio Aguiar, especialista em detecção de ondas gravitacionais da Divisão de Astrofísica do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Inpe. Outro fenômeno apocalíptico ocorreria nos oceanos. “Com uma atmosfera mais rarefeita, a água entraria em ebulição a uma temperatura inferior a 100°C”, afirma Aguiar. “Bastaria um clima ameno de 25°C para o mar ferver.”
Como se não bastasse, nosso satélite natural, a Lua, se desgarraria da Terra. O mais provável é que acabasse capturada pela órbita do Sol, aproximadamente à mesma distância que nos encontramos dele. “A Lua eventualmente poderia ser recapturada pela órbita terrestre, várias voltas (anos) depois, ou até se chocar com nosso planeta. Tudo dependeria da direção em que ela estivesse se deslocando no exato momento dessa repentina alteração em nossa gravidade, e também da influência gravitacional dos outros planetas”, diz o físico.
Outros fatores essenciais para a vida seriam afetados de maneira igualmente assombrosa. “A gravidade determina a pressão, a densidade e a temperatura – nada menos que as condições que dão forma aos elementos químicos. É a principal força, em escala macroscópica, que vai modelar física e geometricamente os seres vivos”, afirma o astrônomo Othon Winter, da Faculdade de Engenharia da Universidade Estadual Paulista, UNESP, de Guaratinguetá.
Por causa disso, a Terra poderia abrigar bichos e plantas bem maiores que os atuais. “Se tivessem a mesma estrutura físico-química, eles poderiam ser realmente imensos”, afirma o físico Roberto de Andrade Martins, do Departamento de Raios Cósmicos do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas, Unicamp. “Se levarmos em conta apenas o fator de resistência física, um elefante deste mundo hipotético poderia ter um tamanho 2,5 vezes maior do que o elefante que conhecemos, mantendo as mesmas proporções!”
Martins lembra, no entanto, que não é apenas a gravidade que determina as dimensões dos seres vivos. “Podem existir fatores biológicos, e não físicos, que limitam o tamanho dos animais e dos vegetais”, diz ele. Afinal de contas, existem na Terra desde camundongos minúsculos até grandes ratazanas, com estruturas físicas semelhantes; existiam no Brasil tatus e preguiças gigantes, que se extinguiram por motivos biológicos. Numa frase: o tamanho de um animal não é determinado apenas pela possibilidade física de que ele sustente o seu próprio peso.
Para completar, o próprio homem se tornaria um gigante – pelo menos em força. “Uma pessoa que consegue segurar ou erguer um objeto de 40 kg na gravidade normal, poderia com igual esforço, fazer o mesmo com um objeto de 100 kg”, afirma Martins. “Um jogador de futebol num mundo desses, desde que com condições de respirar normalmente, daria um chute que forneceria exatamente a mesma velocidade à bola. A diferença é que ela poderia ir 60% mais longe.” Ou seja: uma patada de fazer inveja a qualquer Nelinho ou Éder Aleixo.