Mênfis, hoje um sítio arqueológico às margens do Nilo, foi uma das cidades mais importantes do Egito Antigo: era capital do nomo de Aneb-Hetch, uma subdivisão territorial que equivaleria a um estado ou província em um país atual.
Por volta de 1200 a.C., a metrópole foi comandada pelo prefeito Ptahmes. Sua tumba pujante foi encontrada em uma escavação feita por caçadores de relíquias europeus em 1885. Eles enviaram a maior parte dos artefatos a museus na Holanda e na Itália – onde estão até hoje.
O local foi abandonado após a exploração pioneira (e pouco cuidadosa) no século 19, e enterrado novamente pela areia com o passar dos anos. Só seria redescoberto em 2010, por arqueólogos da Universidade do Cairo. Por sorte, nem tudo havia sido levado pelos colonizadores: entre os artefatos sobreviventes, havia um pote de cerâmica com um conteúdo esbranquiçado misterioso – coberto por um pedaço de lona que provavelmente fazia as vezes de tampa.
Neste ano, a equipe do químico italiano Enrico Greco – que trabalhou em parceria com os arqueólogos egípcios – diluiu a substância encontrada no interior do jarro em água e a submeteu a dois tipos de análise: cromatografia e espectrometria.
A cromatografia isola as várias moléculas que compõem uma mistura complexa de acordo com a maneira como elas se diluem em substâncias diferentes. Já a espectometria é um pouco mais complicada de explicar – envolve a ionização das moléculas, isto é: tirar ou pôr elétrons nelas.
A intenção de ambas, porém, é a mesma: identificar do que a tal gosma misteriosa era feita. Resultado? Foram encontrados nove peptídeos (fragmentos de proteína) presentes no leite de cabra e de vaca. Para não falar em porcarias típicas da saliva humana, sinal de que os egípcios não passavam uma água nos talheres antes de mergulhá-los de novo no queijo. Também é possível que eles simplesmente tenham conversado com a boca diretamente acima do pote aberto. Não dá para saber ao certo.
“O pessoal do Cairo já suspeitava que fosse comida, por causa do método de conservação e a posição do objeto no interior da tumba”, afirmou Greco ao jornal The New York Times. “Mas nós só descobrimos que era queijo depois dos primeiros testes.” Os resultados estão disponíveis neste artigo científico.
Tudo indica que o queijo do faraó era úmido, fácil de espalhar no pão (embora não se saiba se ele era de fato comido com pão) e estragava rápido. Mas você não faria bem em comê-lo, mesmo na época em que estava fresco: ele estava contaminado com a bactéria responsável pela brucelose, uma infecção alimentar grave que até hoje ameaça quem come laticínios não-pasteurizados.