Você já sabia que o número real de infectados pelo coronavírus é bem maior do que as estatísticas oficiais mostram. Afinal de contas, não há testes para a população inteira. Além disso, grande parte dos contaminados apresenta sintomas leves, ou sintoma nenhum – o que não justifica uma ida ao hospital para fazer o teste.
O estudo mais abrangente já feito no país apresentou seus primeiros resultados. O chamado Epicovid-19 aponta que o número real de pessoas infectadas pelo vírus seria 7 vezes maior do que os 376 mil confirmados no Brasil, totalizando 2,6 milhões de casos.
O estudo analisou 90 cidades do país, onde mora 25% da população brasileira. Nesses municípios, estima-se que 760 mil pessoas já tenham sido infectadas pela doença, o que representa 1,4% da população somada das cidades. Esse número abrange tanto quem já se recuperou da doença quanto quem ainda está com o vírus.
No entanto, os níveis de infecção variam muito entre as cidades. Estima-se que 3,1% da população de São Paulo já teria sido infectada. No Rio de Janeiro, a estimativa é de 2,2%, mas esses não estão nem perto dos maiores índices de infecção do país.
Os 11 maiores índices de infecção estão em municípios da região Norte. As cinco cidades com maior porcentagem de infectados são Breves (PA), com 24,8%, Tefé (AM), com 19,6%, Castanhal (PA), com 15,4%, Belém (PA), com 15,1% e Manaus (AM), com 12,5%. Com exceção das capitais, as outras cidades possuem menos de 200 mil habitantes cada.
Outras capitais apresentam menos de 10% da população infectada. É o caso de Macapá (9,7%), Rio Branco (5,4%), Boa Vista (4,5%), Recife (3,2%), Maceió (1,3%) e Vitória (1,2%). Outras 72 cidades avaliadas não chegam a 1%.
Não tem como testar toda a população para chegar a essa porcentagem, é claro. A pesquisa analisou a presença de anticorpos para o SARS-CoV-2 em um total de 25 mil pessoas das 90 cidades. Com base nesses resultados, eles estimaram a porcentagem real para cada cidade e, em seguida, para todo o país. É o mesmo método das pesquisas eleitorais – tem margem de erro, mas pode dar uma amostra relativamente precisa da realidade. Também vale lembrar que o número real de infectados sempre será maior, em qualquer país. Para os EUA, por exemplo, a estimativa é que haja até dez vezes mais do que os números oficiais – o que significaria quase 20 milhões de infecções por lá.
Bom, apesar da porcentagem considerável de pessoas com anticorpos em algumas cidades, nem os lugares mais infectados estão sequer perto da chamada imunidade coletiva. Ela aconteceria quando 60% a 70% da população adquirisse a doença, e se tornasse imune a ela. A partir daí, a curva de casos ativos da doença começa a cair – isso porque vírus não consegue infectar quem é imune, e essa pessoa também não vai passar ele pra frente.
Outro jeito de “virar” a curva é diminuir o contágio, isolando todas as pessoas que estejam infectadas. O estudo perguntou aos participantes se eles estavam cumprindo as medidas de isolamento – ou seja, se ficavam em casa e saíam apenas para atividades essenciais. Os maiores índices foram nos estados de Santa Catarina (69%), Rio de Janeiro (68,3%), Rio Grande do Sul (67%), Pernambuco (64,5%) e Espírito Santo (63,9%).
O Epicovid-19 ainda não apresentou dados sobre a letalidade das cidades e estados, que também apresentam níveis diferentes de subnotificação de mortes. O estudo ainda deve contar com pelo menos outras três fases. A próxima está prevista para começar no dia 5 de junho, quando vai testar outras 33 mil pessoas de 133 municípios do país.
O estudo está sendo conduzido pela Universidade de Pelotas, junto com outras cinco universidades: USP, Unifesp, FGV, UERJ e Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
Essa é a primeira pesquisa sobre o coronavírus de abrangência nacional, realizada entre os dias 14 e 21 de maio.