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Ciência: a maior arma contra a chuva

Nossa previsão do tempo já tem tecnologia e cérebros capazes de evitar tragédias. Veja o que deu errado. E o que falta para que janeiro de 2011 não se repita

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h48 - Publicado em 21 fev 2011, 22h00
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  • Salvador Nogueira

    São Pedro está com o moral baixo entre as autoridades do país. Falta água? A culpa é dele, que mandou pouca chuva. Apagão? O nível das represas está muito baixo por erro dele. Enchentes? Aí o problema foi água demais que ele mandou cá para baixo. Poxa…

    A mais nova tragédia, na região serrana do Rio de Janeiro, trouxe isso de volta à tona. Tudo bem, foi mesmo a pior causada pelo clima na história brasileira, centenas de mortos, muitas casas destruídas. Mas no ano passado tínhamos visto um drama quase tão assustador, em Angra dos Reis (RJ) e em São Luís do Paraitinga (SP). Pelo menos 75 mortos e centenas de feridos compunham o cenário naquela ocasião. E no ano anterior, também não teve enchente nessa época do ano?

    Pois é. O nome do filme aqui deveria ser “Eu sei o que vocês não fizeram no verão passado”. Porque os governos municipais, estaduais e federal parecem ter uma dificuldade para perceber que a culpa não é do santo, mas da falta de um sistema mais eficiente de mitigação das tragédias. Para que algo assim seja viável, precisamos melhorar alguns pontos falhos. Um deles é a previsão do tempo.

    “A previsão errou na quantidade. Indicou ‘chuva moderada a forte’ para a região. Não ‘extraforte’, como a que caiu”, comenta Antônio Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), principal órgão gerador das previsões meteorológicas no país.

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    Um problema intrínseco dos métodos atuais de previsão do tempo, segundo ele, é o fato de que há pouca física incluída neles, e muita estatística. Isso significa que eles são excelentes para adivinhar fenômenos que seguem um padrão. As estatísticas sobre o passado do comportamento do clima ajudam a saber o que vai acontecer no futuro. Mas a previsão despiroca quando surge uma configuração inusitada. E, nesses tempos bicudos de mudança climática, o que mais devem aparecer nos próximos anos são surpresas desse tipo.

    E agora? A boa notícia é que, mesmo com os atuais modelos, com todas as falhas que têm, a previsão no Brasil deve se tornar muito mais precisa nos próximos anos, graças a um novo supercomputador recém-inaugurado no Inpe. O Tupã, como foi batizada a máquina, é um dos 20 mais rápidos do mundo e custou R$ 31,3 milhões. Em suas entranhas serão processadas simulações meteorológicas bem mais complexas que as de hoje. Se estivesse já em funcionamento na ocasião das chuvas no Rio, ele teria sido capaz de prever a quantidade de água que cairia sobre a região de Teresópolis e Petrópolis.

    A má notícia é que não basta saber quanta chuva vai descer. É preciso também identificar por onde aquele aguaceiro todo vai escoar. A análise do terreno é até mais importante que a da atmosfera.

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    É essa a área que Antônio Nobre pesquisa, inclusive. Ele desenvolveu um sistema que, aplicado a um mapa dos contornos topográficos de qualquer região, é capaz de dizer, de acordo com a quantidade de chuva, que bairros vão alagar, quais casas vão ser levadas pela água e onde tudo ficará mais ou menos intacto. Mas o trabalho ainda está no começo: ele e seus colegas chegaram a fazer um mapeamento da cidade de São Paulo com esse fim, mas ainda há um Brasil a ser desbravado.

    Outro ponto: a falta de um alerta mais claro que pudesse, se não salvar as casas, pelo menos proteger a vida dos habitantes é um dos problemas mais graves a ser resolvidos para episódios futuros. Os jornais cansaram de destacar o caso da enchente em Brisbane, na Austrália, em que os moradores foram avisados por carta que teriam de desocupar suas residências. Por que, então, não existe algo similar por aqui?

    É bem verdade que Brisbane é uma região plana e fica muito mais fácil entender o comportamento da chuva e do rio lá do que num lugar cheio de morros como a região serrana fluminense. Mas, com as previsões meteorológicas mais sofisticadas do supercomputador do Inpe e o trabalho de cientistas como Antônio Nobre, daria perfeitamente para fazer.

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    “Sabendo onde as casas estão sob risco, você pode criar um sistema de alerta similar aos que existem nas proximidades de usinas nucleares”, diz Nobre. “Sirenes poderiam avisar as pessoas de que é preciso sair dali.”

    Quem sabe fique a lição, em meio à catástrofe, de que é preciso fazer muito mais esforços para que a população tenha informação precisa e em tempo hábil para poder se refugiar diante de uma potencial tragédia. Qualquer esforço nesse sentido só tem chance de vingar se o poder público e a ciência caminharem juntos. A alternativa a esse choque de realidade é continuar culpando são Pedro.

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