Uma criatura gigante com aspecto de macaco, pelagem cinza ou marrom-avermelhada, de hábitos noturnos e, principalmente, com fama de pouquíssimos amigos. De acordo com a lenda, cruzar o caminho de algum yeti era problema na certa: os primeiros registros de viajantes que se assustaram com o bichão datam de 1921, e, de lá para cá, vários visitantes de países cercados pela cordilheira do Himalaia relataram encontros nada simpáticos. Infelizmente, nada comprovado — ainda que existam aventureiros como esse explorador japonês, que disse que só não fez uma foto do monstro porque sua câmara havia congelado.
A notícia curiosa é que, ao longo dos anos, foram surgindo algumas “evidências” desses monstros. A lista inclui partes de ossos, dentes, pelos e fezes de ‘homens das neves’, a maioria, encontradas por xamãs locais ou guardadas como relíquias dentro de monastérios. Acreditava-se que, a partir delas, daria para conhecer um pouco melhor os yetis (e confirmar, quem sabe, se eles são mesmo fãs de sorvete).
Coube a um novo estudo, publicado no jornal Proceedings of the Royal Society B, provar que sim, feras desse tipo de fato serão um incômodo para quem resolver se aventurar pelas montanhas geladas do Himalaia. O fato é que, diferente da lenda, o problema não está exatamente nos yetis, mas em bichos um tanto mais comuns. Isso porque, das nove amostras analisadas pelos cientistas, oito delas pertenciam a espécies de ursos que vivem na região — e a última, ao invés de uma presa de yeti, não passava de um dente de cachorro. Ou seja, quem disse ter paralisado de medo ao avistar um ser bípede de quase duzentos quilos, errou de alvo, confundindo o monstro lendário com algum outro carnívoro mais familiar.
“Nossa descoberta sugere fortemente que os elementos biológicos que sustentam a lenda do yeti podem ser encontrados em ursos locais”, explica Charlotte Lindqvist, que liderou a pesquisa, em entrevista à AFP. A análise do grupo focou no DNA mitocondrial de três espécies: urso negro asiático, urso pardo do Himalaia e urso pardo tibetano. Para comparar os resultados, Lindqvist recorreu a amostras de ossos, fezes e pêlos de ursos de verdade, cedidos por museus e zoológicos, que acusaram na hora o equívoco histórico.
Além de derrubar toda o mito da existência dos ‘homens das neves’, o estudo serviu também para definir melhor a árvore genealógica desses ursos asiáticos. Descobriu-se, por exemplo, que dois ursos marrons da região, o do Himalaia (Ursus arctos isabellinus) e o tibetano (Ursus arctos pruinosus), são bem distantes geneticamente um do outro — apesar de, por muito tempo, terem sido considerados subespécies. A diferenciação teria acontecido há pelo menos 650 mil anos, quando a formação de geleiras isolou as duas populações. Atualmente, os dois tipos de urso se encontram em estágios críticos de conservação, consideravelmente ameaçados de sumir no mapa nos próximos anos. Tá aí um triste motivo para o fato dos yetis ‘darem as caras’ tão raramente.