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O lagarto brasileiro teiú é 1º réptil que produz calor próprio. Mas como?

Essa espécie tupiniquim desenvolveu um mecanismo celular similar ao das aves e dos mamíferos, nunca antes visto nos répteis, para aquecer seu sangue.

Por Eduardo Lima
28 jul 2024, 14h00

Os répteis, como aprendemos na escola, são animais de sangue frio. Além deles, anfíbios e peixes também são ectotérmicos: dependem do calor do ambiente para se aquecer. Há uma exceção que prova a regra, e ela é do Brasil: o teiú consegue se aquecer com o calor do próprio corpo, sem depender do ambiente externo, durante seu período reprodutivo.

O Salvator merianae habita grande parte do Brasil, o norte da Argentina e do Uruguai. Um grupo de cientistas apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) descobriu que o teiú regula sua temperatura corporal sem depender de condições externas, mas só durante o período reprodutivo. Os resultados dessa pesquisa foram publicados na revista científica Acta Physiologica.

Só as aves e os mamíferos são conhecidos por serem endotérmicos, ou terem “sangue quente”. Esse estudo é a primeira vez que esse comportamento é observado dessa maneira num réptil. A autora principal do estudo, Livia Saccani Hervas, começou a pesquisar os teiús antes mesmo de terminar a faculdade, em sua iniciação científica. Agora, ela é doutoranda na Unesp.

Já em 2016, pesquisadores brasileiros descobriram que os teiús deixavam seus corpos mais quentes do que as tocas onde passavam a noite durante o período reprodutivo. Mas ainda não se sabia como eles, animais de sangue frio, conseguiam fazer isso sem a luz do Sol para se aquecer. Até agora.

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Fábrica de calor

Os cientistas passaram três anos colhendo biópsias do músculo esquelético de dez espécimes de teiú. Eles fizeram isso durante o verão, em fevereiro, e na primavera, em setembro e outubro. Esses pequenos pedaços de tecido, tirados de uma das patas dianteiras e uma das traseiras, foram submetidos a análises bioquímicas e a um calorímetro, medindo o calor emitido.

Durante o período reprodutivo, tanto o músculo dos machos quanto das fêmeas produzia muito mais mitocôndrias do que o normal. Essa organela é a responsável por produzir energia nas células, queimando o carboidrato comido com o oxigênio respirado e gerando gás carbônico. O calor, muitas vezes, é um subproduto do processo de geração de energia da célula.

A proteína ANT, ligada a um processo bioquímico que gera calor nas aves, era mais presente e mais ativa nas mitocôndrias durante o período reprodutivo. O calor extra é usado pelas fêmeas para gerar os ovos e construir os ninhos, e pelos machos para buscar territórios e aumentar suas gônadas, as glândulas onde estão localizadas as células reprodutivas e onde são produzidos os hormônios sexuais.

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Antes da descoberta sobre os teiús, os únicos répteis conhecidos que conseguiam aumentar sua temperatura eram pítons. As serpentes asiáticas, que podem chegar a cinco metros de comprimento, tremiam, agitando os músculos para gerar calor e ajudar a chocar os ovos. O teiú não precisa tremer para ficar mais quente.

Talvez a endotermia seja mais frequente entre os répteis do que se imaginava, com os exemplos dos teiús e das pítons. A estratégia celular dos lagartos, muito parecida com a das aves e dos mamíferos, pode ser um indício de que o sangue quente tem raízes evolutivas mais antigas do que se imaginava.

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