Quando pesquisadores decidem investigar o comportamento de novos remédios, vacinas, cosméticos e até produtos químicos em um ser vivo, quem costuma assumir a bronca de início é o Rattus norvegicus, a espécie de rato mais usada em laboratório. A resposta dada pelas cobaias é que permite que os produtos avancem nos testes e, com sorte, venham a servir para humanos no futuro.
Mas por que os ratinhos foram os eleitos para essa etapa intermediária? A resposta passa por sua fisiologia, relativamente próxima a dos seres humanos, mas principalmente por seu custo benefício. Um cientista que deseja saber como certa droga afeta os filhotes, por exemplo, consegue ter uma resposta em 21 dias – tempo de gestação da espécie. Além de se reproduzirem rapidamente, eles também atingem a maturidade em um intervalo curto de tempo.
O fator econômico também pesa. Dóceis, pequenos e fáceis de manipular, ratos podem ser guardados em locais menores sem a necessidade de supervisão constante – diferentes do que bichos maiores, como coelhos, porcos, macacos ou cachorros demandariam. O problema é que, ainda que somem todas essas vantagens, ratinhos ainda não são humanos. E, por isso, sua biologia e as funções de seu organismo podem nem sempre espelhar o que acontece com o Homo sapiens. E isso pode prejudicar o resultado de determinadas pesquisas.
É o que destaca um novo estudo, desenvolvido por pesquisadores americanos. Por meio de um extenso levantamento, cientistas compararam milhares de neurônios humanos com os de ratos. Nesse processo, eles encontraram diversas semelhanças. À rigor, humanos e ratos têm a mesma variedade de células cerebrais em seu córtex, camada mais externa do cérebro que coordena tarefas sofisticadas como planejamento e tomada de decisão. São, ao todo, 75 tipos de neurônios que têm poucas diferenças entre as duas espécies.
Mas um ponto importante acaba ficando de fora: o processamento da serotonina. “Uma das diferenças mais marcantes entre ratos e humanos são os receptores de serotonina, hormônio que está envolvido na expressão de doenças como a depressão. Essa proteína existe nas duas espécies – mas se expressam em tipos diferentes de células”, diz Ed Lein, pesquisador do Instituto Allen envolvido no estudo, no vídeo a que você pode assistir abaixo.
Os genes que reúnem instruções sobre como as células percebem a serotonina, portanto, são diferentes em ratos e humanos. As particularidades de cada espécie, assim, fazem com que ratinhos de laboratório não sejam os melhores modelos para testes envolvendo níveis de serotonina. Sabe-se que doenças como depressão, esquizofrenia e Alzheimer por exemplo, alteram os índices normais desse hormônio no corpo.
“Deveríamos ter um pé atrás quanto ao uso de ratos o estudo de problemas que comprometem o mecanismo de ação da serotonina”, completa Lein. Você pode ler o estudo completo, publicado na revista científica Nature, neste link.