Nesta segunda-feira (1), durante a COP26, a Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, que acontece em Glasgow, o Brasil apresentou sua nova meta de redução de emissão de gases-estufa. Ela agora prevê a neutralização das emissões de carbono até 2050 e um corte de 50% até 2030.
O anúncio foi feito pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, e representou um avanço comparado ao que o governo federal havia anunciado antes, quando apresentou uma meta de reduzir as emissões em 43% até 2030. O presidente Jair Bolsonaro, que participou da conferência do G20 no último final de semana, optou por permanecer a passeio na Itália. Para a Cúpula do Clima, ele gravou um vídeo que precedeu a fala de Leite.
Mesmo com o avanço, não está claro que o país tenha de fato elevado suas ambições com relação ao que fora apresentado em 2015, quando aderiu ao Acordo de Paris. Na ocasião, o valor proposto para as reduções até 2030 era de 43%, mas com relação ao padrão de 2005, que era de 2,1 gigatoneladas anuais de CO2e (dióxido de carbono equivalente, uma forma de somar todos os gases emitidos numa unidade só, baseada no efeito atmosférico do CO2, o mais importante dos gases-estufa).
Só que, em dezembro de 2020, o governo brasileiro atualizou sua proposta, mantendo os 43%, mas levando em conta uma nova estimativa do nível de emissões em 2005, que passou a 2,8 gigatoneladas de CO2e.
Ou seja: na prática, o país prometia cortar a mesma quantidade, mas partindo de uma base maior, o que representava um aumento com relação à proposta firmada em Paris para 2030. Com a atualização de 43% sobre 2,1 gigatoneladas para 50% sobre 2,8 gigatoneladas, a ambição em termos de emissões ficou do mesmo tamanho. Reduz o que estava sendo chamado de “pedalada climática”, mas não amplia de fato a meta brasileira apresentada no Acordo de Paris – objetivo explícito da COP26.
A proposta foi recebida com críticas por ambientalistas. “O governo teve todas as oportunidades para fazer uma mudança de rumo”, declarou Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, organização que reúne dezenas de entidades ambientais. “Há mais de uma análise que mostra que o Brasil tem todas as condições de agir com ambição real, reassumindo seu protagonismo no debate climático. Infelizmente isso não acontecerá com Bolsonaro.”
A principal fonte de emissões no Brasil é o desmatamento, e o governo apresentou metas específicas para ele, com uma redução de 15% ao ano até 2024, zerando a derrubada de mata nativa até 2028. Infelizmente, o anúncio não vem acompanhado de medidas para atingir o objetivo. Nos últimos anos, o que se viu foi uma escalada nas taxas de desmatamento, com crescimento explosivo a partir de 2019.
O Ministério do Meio Ambiente anunciou também que o país deve ter 45% a 50% de sua matriz energética composta por fontes renováveis até 2030. Não é uma meta impossível, dado que o Brasil já tem uma base importante proveniente de seu parque hidrelétrico. Mas, novamente, ela não orna com ações recentes do governo, como a medida provisória de privatização da Eletrobras, que trouxe consigo vários “jabutis” (trechos inseridos por parlamentares que extrapolam a proposta original), como a obrigatoriedade de contratação de termelétricas movidas a gás natural em várias regiões do país.
E aí reside a crise de credibilidade do Brasil na COP26: além de não ter apresentado metas realmente ambiciosas, o que foi de fato anunciado é incompatível com as atitudes do governo, tornando o país alvo de desconfiança e desprezo internacionais.
Liderar pelo exemplo
Quem esteve nesse mesmo barco nos últimos anos e agora está tentando reaprumar são os Estados Unidos. Em seu pronunciamento no início da Cúpula do Clima, o presidente Joe Biden defendeu que a reunião deve servir como o “ponto de partida para uma década de ambição e inovação para preservar nosso futuro compartilhado”: “Encontramo-nos com os olhos da história sobre nós. Faremos o que é necessário? Ou vamos condenar gerações futuras a sofrerem?”,
Biden tem telhado de vidro, já que está tentando recolocar os EUA no centro do palco no combate à crise climática depois que seu antecessor, Donald Trump, simplesmente abandonou o Acordo de Paris. O presidente admitiu que grandes poluidores, como os EUA, têm responsabilidade em ajudar nações menores que já enfrentam os efeitos da transformação do clima.
A despeito das palavras bonitas, ambientalistas criticam a administração Biden por não ter tido ações compatíveis com o discurso. Há uma proposta ousada de legislação para a crise climática nos EUA, mas ela segue parada no Congresso americano.
Enquanto isso, o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, alertou em seu discurso que “estamos cavando nossas próprias covas” ao falhar em reduzir dramaticamente as emissões globais de gases-estufa. A ambição dos diplomatas e chefes de estado reunidos em Glasgow é tentar mudar esse rumo ao longo dos próximos 12 dias.