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7 mitos sobre Ayrton Senna

Ninguém encarnou a figura de herói nacional de forma tão completa quanto esse paulistano morto num mal explicado acidente de trabalho, aos 34 anos. E, como acontece em todas as sagas heroicas, a de Senna ficou cada vez mais envolta numa mitologia particular. Agora, 20 anos depois de sua morte, levantamos alguns desses mitos - e revelamos os verdadeiros fatos por trás deles.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h15 - Publicado em 27 ago 2014, 22h00
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  • Marcos Abrucio

    Mito 1 – Senna ganharia tantos títulos quanto Schumacher

    Fato – Ayrton só teria um carro suficientemente bom tarde demais.

    Um segundo antes de bater a 216 km/h e ter o capacete perfurado por uma das barras de suspensão de sua Williams, Senna estava liderando o GP de San Marino, com Schumacher em segundo. Mas e se ele tivesse contornado aquela curva e continuado vivo? Provavelmente ganharia o título de 1994, tornando-se o terceiro tetracampeão da história da Fórmula 1 – depois de Alain Prost, seu grande rival, e do argentino Juan Manuel Fangio (que correu nos anos 50 e ganhou cinco títulos). Schumacher tinha o melhor carro: das sete primeiras corridas do ano, ganhou seis, duas delas batendo Senna na pista com um pé nas costas. Porém, o alemão acabou desclassificado de duas provas e banido de mais duas (por uma série de irregularidades dele e do carro). Desse jeito, perdeu tantos pontos que até Damon Hill, o medíocre sucessor de Senna como primeiro piloto da Williams, terminou o ano apenas um ponto atrás de Schumacher, o campeão daquela temporada. Senna não faria menos pontos que Hill nem se participasse das corridas por teleconferência. Seria campeão em 1994. Mas talvez fosse seu último título. Em 1995, Schumacher e a Benetton foram mais arrasadores ainda. A Williams voltaria a ter o melhor carro do grid nos dois anos seguintes. Mas Senna não estaria mais lá: estava apalavrado de ir para a Ferrari em 1996. Jean Todt, então diretor da escuderia, confirmou isso anos mais tarde – quando Ayrton morreu, aliás, o time pegou o contrato que estava preparado para ele e deu para Schumacher, que entrou para a equipe justamente em 1996. A Ferrari só viraria um carro realmente dominante no ano 2000. Àquela altura, Schumacher ainda era jovem. Tinha 31 anos e preparo físico suficiente para ganhar cinco títulos seguidos (como de fato conquistou). Senna, não. Em 2000, ele estaria com 40 anos – o que é muito para um piloto de Fórmula 1. Talvez tivesse pendurado o capacete antes disso até, cansado dos anos de vacas magras da Ferrari, que aconteceriam com ou sem ele.

    Mito 2 – O Tema da Vitória era a “musiquinha do Senna”

    Fato – Nada disso. até para o Prost a musiquinha já tocou.

    Difícil ouvir o “pam-pam-pam” e não se lembrar de Senna. Mas quando a música foi tocada em rede nacional pela primeira vez, ele nem havia estreado na F-1. Composto por Eduardo Souto Neto (criador também do jingle do Rock in Rio) e gravado com a participação do grupo Roupa Nova, o Tema da Vitória foi encomendado pela Rede Globo para ser a trilha de encerramento do GP do Brasil – não importava quem fosse o vencedor. A estreia da música, em 1983, foi na vitória de Nelson Piquet em Jacarepaguá. Ironicamente, no ano seguinte quem chegou na frente foi Alain Prost, e o Tema da Vitória foi tocado para o maior rival de Senna (pode procurar o vídeo disso no Youtube).

    Só a partir de 1986 a melodia passou a embalar as vitórias dos brasileiros em todos os GPs. Aí Senna dominou: foram 38 execuções para ele – e uma identificação mitológica entre a imagem do piloto e a melodia triunfal. Só para comparar: Piquet, Rubens Barrichello e Felipe Massa tiveram 11 vitórias cada um acompanhadas pelo “pam-pam-pam”.

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    Mito 3 – Ele estreou fazendo milagre com uma carroça, a Toleman

    Fato – O carro até que andava bem.

    Senna tinha sido campeão da Fórmula 3 inglesa em 1983. Deu um verdadeiro show, com 12 vitórias em 21 corridas, e estava bem cotado para estrear na F-1 em 1984. Foi fazer um teste na Williams, mas a equipe não tinha vaga disponível. Ferrari e Brabham também estavam de portas fechadas. A McLaren tinha feito uma oferta, mas o negócio não foi adiante. Ele acabou assinando com uma equipe modesta: a Toleman. Durante 50 anos, ela foi apenas uma transportadora do interior da Inglaterra. Em 1977, trocou os caminhões pelos carros de corrida, passou pela Fórmula Ford, Fórmula 2 e, em 1981, chegou à F-1. No fim de 1983, a Toleman estava em alta, marcando pontos nas quatro últimas provas. Seu projetista tinha acertado a mão: era Rory Byrne, que depois desenharia os carros de Michael Schumacher na Benetton e na Ferrari.

    Logo na segunda corrida, Senna chegou em sexto e conquistou seu primeiro ponto.

    No final do ano, tinha mais 12, além de três pódios. Uma façanha e tanto, mas o carro também ajudava: no GP da Itália, Senna foi substituído por Stefan Johansson. Mesmo sendo um piloto medíocre, o sueco chegou em quarto. O valor da equipe, aliás, pode ser visto em seus “descendentes”: em 1985, com a chegada de um patrocinador italiano, a Toleman mudou de nome para Benetton. Foi bicampeã mundial, com Schumacher. Depois, passou a chamar-se Renault e ganhou mais dois títulos, ambos com Fernando Alonso. Hoje, a estrutura da antiga Toleman pertence à Lotus.

    Mito 4 – Senna ganharia o GP de Mônaco no seu primeiro ano de F-1

    Fato – Chegar em segundo foi lucro. E o grande nome daquela corrida foi outro.

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    Para quem não se lembra: debaixo de um aguaceiro, um Senna novato, de 25 anos, larga em 13o e vai galgando posições. Depois de ultrapassar a lenda viva Niki Lauda como se o austríaco estivesse dirigindo uma Kombi, assume a segunda colocação, prestes a ultrapassar o líder, Alain Prost. E então… Mandam interromper a prova, ainda na 31a das 76 voltas previstas. A parada foi vista como manobra para ajudar Prost (que corria “em casa”, já que o principado de Mônaco é encravado na França). Uma manobra que impediu a vitória certa de Ayrton, em pleno ano de estreia e numa equipe pequena. Mas não foi bem assim.

    A verdade é que Senna dificilmente terminaria aquela corrida se ela fosse até o fim. Um mecânico da Toleman, John Walton, revelaria mais tarde que a suspensão do brasileiro estava para arrebentar, danificada depois de ele voar sobre uma zebra.

    Ricardo Divila, antigo projetista da Fittipaldi-Copersucar e com passagens por diversas equipes de F-1, lembra de outro detalhe. “Embora Ayrton estivesse chegando no Prost, Stefan Bellof estava chegando nos dois, virando mais rápido”. O jovem alemão da Tyrrell largara em 20o e era o terceiro naquele momento. “Na comunidade automobilística, essa corrida é tida como do Bellof.”

    Passar Senna não seria fácil. Ainda mais em Mônaco. Além disso, os pontos da Tyrrell foram cancelados no fim da temporada, por irregularidades nos carros. Mas, se a Toleman tivesse quebrado e Bellof tivesse ganho, ele seria considerado a grande revelação do ano – como Senna foi. No fim, o segundo lugar talvez tenha sido o melhor resultado possível para o brasileiro. Bellof continuou na Tyrrell, mas não foi longe. Em setembro de 1985, ele sofreu um acidente gravíssimo durante uma corrida de protótipos em Spa Francorchamps, na Bélgica. Morreu na pista, como Ayrton.

    Mito 5 – Ayrton era o gênio injustiçado. Prost, o Dick Vigarista

    Fato – Nenhum era exemplo de caráter. E os dois eram gênios.

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    Prost e Senna jogaram pesado um com o outro. E foi Ayrton quem atirou primeiro. No caso, sua McLaren contra a de Prost: no GP de Portugal de 88, ele espremeu acintosamente o francês contra o muro da reta principal. A guerra entre os dois começou ali. E explodiu depois de outra manobra de Senna, no GP de Ímola de 1989. Prost saiu na frente. Na primeira freada, Senna tomou a liderança para não largar mais até o final. O companheiro de equipe ficou possesso: “Havia um pacto dentro da McLaren para que eles não disputassem a ponta na primeira volta”, diz o jornalista Ernesto Rodrigues, autor de Senna – O Heroi Revelado. É que a McLaren era muito mais rápida do que os outros carros, e por isso Senna e Prost achavam melhor abrir vantagem primeiro e só depois disputar a liderança. Mas o brasileiro descumpriu o acordo. Prost reclamava de Senna sempre receber os melhores motores da Honda, fornecedora da McLaren. Senna lamentava a influência política de Alain (grande o suficiente para lhe garantir um título no tapetão, em 1989). Os dois estavam certos. Mas nem Senna era o gênio injustiçado nem Prost o manipulador das regras. Em 1988, quando foi campeão pela primeira vez, Ayrton fez 11 pontos (33 de hoje) menos que o francês. Só levou o título porque o regulamento obrigava cada piloto a descartar seus cinco piores resultados.

    Nos anos seguintes, continuaram batendo um no outro dentro e fora da pista. Mas, quando Prost se aposentou, se reaproximaram. Senna chegou a mandar um recado de dentro do carro para ele, que trabalhava como comentarista na TV francesa: “Sinto sua falta, Alain”. Morreu dois dias depois.

    Mito 6 – Ele foi o único a dar show com uma marcha só

    Fato – Schumacher repetiu o feito.

    Não podia ser mais épico: Senna recebe a bandeirada em Interlagos aos gritos e para na pista. Com espasmos musculares nos ombros, braços e pescoço, não consegue sair do cockpit. Dez voltas antes, ele tinha 40s de vantagem para o segundo colocado, Riccardo Patrese. Tudo lindo, se a 4a. marcha da sua McLaren não tivesse ido para o espaço. Duas voltas depois, perde a 3a. e a 5a. Aí, sobra apenas a 6a.

    Senna mudou o jeito de pilotar, segurando o carro no braço nas curvas de baixa, porque tinha que manter o giro lá em cima para o motor não apagar. Chegou 2,99s à frente de Patrese. Uma façanha literalmente inacreditável – rivais acharam que fosse tudo marketing, que ele não tinha perdido marchas coisa nenhuma. Inveja pura: “Era visível e audível a progressiva perda de marchas”, explica o engenheiro Ricardo Divila, que projetou vários F-1. A câmera onboard não deixa dúvidas: Ayrton nem toca no câmbio nas ultimas voltas. Uma proeza incrível. Mas não única.

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    Schumacher fez a mesma coisa depois. Sabe aquelas seis vitórias nas sete primeiras provas de 1994 (mito 1)? Só não foram sete em sete porque numa dessas corridas, o GP da Espanha, ele ficou apenas com a 5a. marcha, faltando 45 voltas para o final. Perdeu a liderança para Hill, mas mesmo assim chegou em segundo – e ainda fez dois pit stops, parando e partindo com a única marcha que tinha. Épico.

    Mito 7 – Senna morreu porque a barra de direção quebrou

    Fato – Existe outra hipótese, tão possível quanto.

    Senna bateu a 216 km/h, em um ângulo de 22 graus, no muro da curva Tamburello. A roda se soltou e o braço da suspensão entrou como uma lança pela viseira, causando morte cerebral instantânea. Essa é a parte da qual se tem certeza. Mas o que fez o carro sair da pista daquela forma?

    A teoria mais conhecida, e sustentada pelo inquérito da justiça italiana, culpa a barra de direção. Alongada a pedido de Senna, ela teria se rompido, deixando o piloto sem controle do carro. Em seu livro, Ernesto Rodrigues conta que Frank Williams teria confirmado isso em um encontro com a família Senna.

    Mas há quem considere que a barra só quebrou depois da batida. “Fontes internas da Williams e da FIA me confirmaram isso”, diz Ricardo Divila. “Qualquer trabalho em peças de suspensão, direção e freios, itens de segurança, é feito com muito cuidado”.

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    Ele acredita em outra explicação, defendida por vários especialistas: os pneus estavam frios (porque os carros estavam andando devagar, atrás do Safety Car), e perderam 25% da pressão. O carro ficou até 5 mm mais baixo. Então bateu no chão a quase 300 km/h e passou a deslizar sobre a parte traseira do assoalho, como se fosse um trenó, indo direto para o muro. Seja essa hipótese, seja a outra, a verdade é que Ayrton não tinha como fazer nada. Até aquele 1o de maio, o piloto considerado o maior da história era Jim Clark, campeão em 1963 e 1965. Pesava a favor do escocês, além da genialidade, o fato de ter morrido na pista. O martírio transformou Clark em semideus. Mas Senna o superou: ao morrer liderando uma corrida, e no auge da forma, ganhou uma aura ainda maior. E até hoje lidera a mais especial das corridas: a dos maiores pilotos de todos os tempos, à frente de Fangio, Clark, Stewart, Prost, Schumacher, Vettel, Piquet. E, talvez, de quem mais vier.

     

    Imagem: gettyimages.com

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