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Breve história da ovada política

O ovo, ao contrário da coxinha ou da mortadela, se mantém firme, forte e apartidário desde a Idade Média

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 8 ago 2017, 14h43 - Publicado em 8 ago 2017, 14h37
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  • “Vão jogar ovo na Venezuela!”, bradou João Doria (PSDB), prefeito de São Paulo, após ser atingido na cabeça por um ovo voador em visita à Salvador na última segunda-feira. O político foi à Câmara de Vereadores da capital baiana receber o título de cidadão soteropolitano, e entrou na mira de manifestantes conforme cruzava a Praça Tomé de Souza, que concentra os prédios da administração pública no centro histórico da cidade.

    Diante da revoada de bólidos brancos e frágeis, lançados por estudantes e membros de centrais sindicais, o paulistano e seus acompanhantes – entre eles o prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM) – tentaram abrir sombrinhas para se proteger, à moda da formação tartaruga empregada pelas legiões romanas. Não foram, porém, rápidos o suficiente (veja o vídeo).

    Com a gema escorrendo pelos cabelos, Doria não sai da vida, mas entra para uma história que começa lá na Idade Média, com influência da Antiguidade: a da ovada como forma de protesto político.

    (1) O mais antigo antecedente conhecido da prática seguiu o mesmo espírito, mas não a mesma receita. Em 63 d.C., Vespasiano – que na época era governador dos atuais territórios da Líbia e da Tunísia – foi atingido por grandes quantidades de uma planta crucífera de raiz tuberosa e folhas comestíveis que, em português, atende pelo nome de… nabo. É, nabo.

    (2) Os ovos, menos doloridos e consideravelmente mais humilhantes, se tornaram hábito na Idade Média. Nos vilarejos da época, ladrões de objetos de pouca importância eram sentenciados a um pequeno período no estábulo – onde, além de dividir espaço com vacas e porcos, eram bombardeados por ovos e tomates velhos fornecidos por moradores revoltados.

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    (3) Na segunda metade do século 16, enquanto a extração de pau-brasil ocorria a todo o vapor deste lado do Atlântico, o público das peças de teatro renascentistas britânicas – que você conhece graças a Shakespeare – adotou o ovo podre como forma de protesto contra atuações ruins.

    “Isso é arte, não política”, você dirá com razão. Mas é graças a aplicações como essa que o lançamento de ovos se tornou uma tradição anglo-saxã – em países latinos, jogar comida nos outros às vezes é um ato amigável (vide a tradicional “batalha” de laranjas na cidade italiana de Ivrea). Na Grécia, o arremesso de iogurte é uma pedida mais comum. Na Ucrânia, lembra o The Guardian, a embaixada russa já amanheceu com ornamentos de macarrão instantâneo.

    (4) Cinco séculos se passaram e a tradição da ovada prosperou – foi inclusive importada para as Treze Colônias, nome dos territórios que dariam origem aos EUA. Em tempos contemporâneos, Margareth Thatcher, David Cameron, Ruth Kelly, Arnold Schwarzenegger (sim, o exterminador), Nick Griffin e Simon Cowell foram só alguns dos nomes da política anglófona que viraram – para citar Adoniram Barbosa – “tauba de tiro ao álvaro“.

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    (5) Na política brasileira atual, há poucas coisas tão democráticas quanto a ovada. Invólucros de cálcio com gema e sem pintinho atingiram o governador de São Paulo Mário Covas (PSDB) em 1999, e deram rasantes perigosos na prefeita de São Paulo Marta Suplicy (na época, do PT) em 2004. Nem o famigerado Paulo Maluf (PP) escapou: sua vez chegou em 2001.

    (6) O vilarejo de Swaton (que fica na Inglaterra, como não poderia deixar de ser) organiza edições anuais do torneio mundial de lançamento de ovos, uma tradição de 700 anos, iniciada em 1322. As provas envolvem o arremesso e a recepção de ovos de distâncias de no mínimo dez metros, e a ideia é apanhá-los no ar sem danos. Ali não há divergências políticas – só a celebração do alimento que, ao contrário de coxinhas e mortadelas, vem escapando do proselitismo por toda a história da humanidade.

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