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Comida cara: a fonte dos protestos

A inflação dos alimentos é global, serve de combustível para as manifestações e tem um culpado: o Brasil. Veja por quê

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Atualizado em 31 out 2016, 19h01 - Publicado em 4 nov 2013, 22h00
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  • Alexandre Versignassi e Ana Carolina Prado

    Pãozinho na chapa com pingado: R$ 9. Frango assado: R$ 48. Milk-shake: R$ 40. Preços desse quilate deixaram o reino da ficção e das lanchonetes de aeroporto faz tempo. E a obesidade mórbida dos preços virou um caso de saúde pública – de saúde financeira do público, no caso.

    Isso não é um fenômeno exclusivo do Brasil. A inflação da comida é global. E mais indigesta do que parece. É o que mostra um estudo do Instituto de Sistemas Complexos da Nova Inglaterra, nos EUA. Fizeram uma pesquisa relacionando os preços dos alimentos com as revoltas populares pelo mundo. E viram que os dois fenômenos têm uma relação intrínseca: quanto mais cara a comida, maior a quantidade de revoltas.

    A ONU faz um levantamento contínuo dos preços dos alimentos pelo mundo. É o Food Price Index. Esse índice mostra que o custo da alimentação deu um salto no começo do século 21. Uma cesta de alimentos que custava US$ 100 em 2003 chegou a um pico de US$ 220 em 2008. E a quantidade de protestos de rua aumentou no mesmo ritmo: o estudo contabilizou 60 em vários países, contra meia-dúzia nos anos anteriores. O motivo é tão óbvio que nem precisa de cientista para explicar. Basta o presidente do Banco Central: “A atenção com a inflação aumenta quando a pressão vem desse segmento [o dos alimentos], já que todos nós temos relação com ele”, disse Alexandre Tombini numa entrevista recente.

    Em 2009, o preço global da comida baixou. E a quantidade de revoltas também. Mas tudo o que desce tem de subir, diz a física financeira. E o repique dos alimentos veio rápido. No final de 2010 aquela cesta já estava roçando os US$ 200 de novo. E o que veio foi revolta de todo lado: Tunísia, Líbia, Síria, Argélia… Mais de 200 protestos pelo mundo. E a chegada da Primavera Árabe. No Egito, aliás, os “20 centavos” do movimento foram justamente o preço do pão.

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    No Brasil, o gatilho alimentício das revoltas não foi exatamente o preço do pão. Mas o do menu degustação. Uma das marcas dos nossos protestos populares é que eles não foram tão populares assim. O grosso do pessoal ali era de classe média. E o que mais subiu de preço por aqui foi justamente a comida da classe média – a dos restaurantes. Entre junho de 2012 e junho de 2013, comer fora ficou 11% mais caro, segundo o IBGE. Se for lanche, 14%; o dobro da inflação geral no mesmo período, que foi de 6,7%.

    Claro, óbvio, que NINGUÉM foi para a rua no Brasil para protestar contra preço do temaki e do confit de pato. Mas uma coisa é fato: os primeiros sinais de desassossego foram, sim, uma reação ao preço dos alimentos. É só lembrar do tomate. Uma entressafra combinada com uma redução nas áreas de plantio bombou o preço em mais de 1.000% – de menos de R$ 1 o quilo em 2010 para R$ 10 na primeira metade de 2013, turbinando os preços das cantinas e pizzarias, e levando o tomate às capas das revistas semanais. Depois o quilo voltou para valores terráqueos, mas o incômodo com o preço dos alimentos continuou firme – comunidades de Facebook como o Boicota SP, criadas para reclamar contras os preços altos dos restaurantes, servem de prova.

    Em suma: os centavos a mais no ônibus foram o estopim dos protestos. Fato. Mas o fósforo que acendeu esse estopim foi a inflação das refeições.

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    Cada país tem seus motivos para explicar o preço mais alto de sua comida. Nos EUA, as subidas têm a ver com o etanol – cada vez mais do milho que eles plantam vira combustível, e isso pressiona o custo de produção do Sucrilhos. No Brasil, a inflação dos alimentos anda de mãos dadas com a inflação generalizada, cortesia da nossa política econômica: o governo injetou mais dinheiro na economia do que ela dava conta de suportar. E quando existe mais dinheiro no mercado do que produtos para comprar, os preços aumentam.

    Mas não é só isso. Também existe um motivo global para a inflação da comida: a China. Nos últimos 25 anos, o consumo de carne lá saltou de 8,4 milhões de toneladas para 71 milhões. O de soja foi na mesma toada: multiplicou por dez. Para o Brasil, isso foi lindo. Viramos o maior exportador de soja e de carne bovina da história. No ano 2000, nós vendíamos 1,8 milhão de toneladas de soja para os chineses. Em 2012 foram 23 milhões de toneladas. Em carne e laticínios, o salto foi de 21 milhões de toneladas para 248 milhões. Haja boi. Haja vaca. Haja plantação.

    E haja infraestrutura – coisa que o Brasil não tem. Aí que a porca torce o rabo. Boa parte dessa soja e dessa carne se arrasta pelas nossas rodovias esburacadas em lombo de caminhão rumo aos nossos poucos e parcos portos. Depois piora: na boca do porto de Santos, por exemplo, as filas de caminhões se movem a uma velocidade média de 1,6 km/h (segundo um cálculo da Folha de S.Paulo).

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    Agora vamos raciocinar: o enriquecimento dos chineses aumentou a demanda por comida, certo? Se a demanda sobe mais rápido que a oferta, o preço aumenta, diz a física das finanças. Mas, ei: e se a oferta aumentasse? Os preços baixariam. Não só na China, mas no mundo, já que o peso do mercado chinês afeta o planeta todo. E agora vem a pergunta mais importante: como essa oferta poderia aumentar?

    Com o Brasil. Se o escoamento da nossa produção contasse com mais ferrovias e portos, o preço global dos alimentos diminuiria. Ou seja, quem foi para a rua, seja no Brasil, seja no resto do mundo, acabou involuntariamente protestando contra o mesmo mal: o nosso pesadelo logístico. Uma bela causa, diga-se.

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