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Maurice Hilleman, o homem que ajudou a criar mais de 40 vacinas

Ele também colaborou para um dos imunizantes mais rápidos já feitos: o da caxumba, desenvolvido para curar sua filha. Entenda essa história.

Por Rafael Battaglia
Atualizado em 15 jul 2024, 09h47 - Publicado em 12 jul 2024, 12h00

Quanto tempo leva para desenvolver uma vacina? O processo de pesquisa, testagem e aprovação por órgãos de saúde costuma ser demorado (em geral, uma década). Mas há exceções, claro. O imunizante contra a covid-19, por exemplo, foi feito em tempo recorde: dez meses.

Antes disso, a vacina contra a caxumba ocupava o posto de mais rápida já feita: quatro anos. Mas há um detalhe importante: enquanto a corrida pelo imunizante da covid envolveu milhares de pessoas em um esforço global em meio à pandemia, o da caxumba foi desenvolvido, em grande parte, por uma única pessoa, o americano Maurice Hilleman.

Apesar de relativamente desconhecido, Hilleman é uma sumidade no mundo das vacinas. Ao longo de sua carreira, ele desenvolveu mais de 40 imunizantes para animais e humanos, que ajudaram a salvar milhões de vida.

Dentre as criações de Hilleman, estão oito das 14 vacinas presentes na caderneta de vacinação infantil, como sarampo, rubéola, hepatite A, hepatite B e meningite.

Vamos conhecer a sua história.

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Da fazenda para o laboratório

Hilleman nasceu em 30 de agosto de 1919 na zona rural de Montana, estado no meio-oeste dos EUA. Sua irmã gêmea morreu durante o parto. Sua mãe, dois dias depois.

Maurice cresceu durante a forte crise econômica da Grande Depressão, e sua família sobrevivia da venda de frutas, ovos e galinhas. Na adolescência, ele trabalhou em uma loja de departamentos, mas seus outros irmãos o convenceram a entrar na faculdade.

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Eles não poderiam estar mais certos: Maurice conseguiu uma bolsa para estudar microbiologia na Universidade Estadual de Montana e se formou como o primeiro da turma. Depois, ele fez doutorado na Universidade de Chicago. Em sua tese, ele demonstrou que a clamídia é causada por uma bactéria, e não por um vírus, como se imaginava na época.

Maurice, contudo, decidiu não seguir no mundo acadêmico, que ele considerava lento demais. Em vez disso, foi trabalhar na indústria farmacêutica e no exército americano. Foi quando desenvolveu uma vacina para a encefalite japonesa, que ajudou a imunizar as tropas na Segunda Guerra Mundial. Nos anos 1950, ele descobriu que vírus da gripe sofrem mutações anuais – e que atualizar as vacinas constantemente seria o caminho para a proteção.

A gripe asiática – e o papel das aves

Em 1957, Maurice entrou para a farmacêutica MSD (chamada de Merck nos EUA e Canadá), empresa na qual ele ajudou a criar boa parte das vacinas que estão no seu currículo. Naquele ano, ele foi um dos primeiros a perceber uma cepa do vírus da gripe em um surto em Hong Kong poderia dar origem a uma pandemia global.

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Ele estava certo: entre 1957 e 1958, a chamada gripe asiática matou dois milhões de pessoas no mundo. Nos EUA, morreram 70 mil – um número que poderia ter sido maior, não fossem os esforços coordenados por Hilleman.

Além de isolar a cepa para estudá-la, Hilleman organizou uma campanha para que os criadores de galos não matassem os seus animais ao final do ciclo de criação deles. Pelo seu passado na fazenda, Maurice sabia que ovos fertilizados eram (e são) matéria-prima para fabricar vacinas: os vírus são cultivados na membrana do embrião e crescem até serem mortos (ou enfraquecidos), para serem usados nos imunizantes.

Graças a Maurice, os EUA tiveram à disposição vários galos, o que permitiu a criação de milhões de doses de vacina. Por esse trabalho, ele recebeu a Medalha de Serviços Distintos do exército americano.

Uma vacina para a sua filha

Em 1963, uma das duas filhas de Maurice, Jeryl Lynn, acordou no meio da noite se sentindo mal. Ela tinha cinco anos na época, e seu pai logo começou a analisar os sintomas.

Na mesma noite, Hilleman foi até o seu laboratório e voltou para casa com um cotonete e os outros instrumentos necessários para coletar amostras da mucosa da boca de Jeryl. Maurice suspeitava que a filha estava com caxumba, uma infecção viral que inflama as glândulas salivares.

O cientista queria saber se era uma cepa do vírus mais inofensiva ou uma mais perigosa, cuja infecção pode chegar até o cérebro. Já existiam vacinas contra caxumba desde os anos 1940, mas elas ofereciam apenas proteção por um curto período de tempo.

Maurice descobriu que era uma cepa mais inofensiva, o que permitiu a criação de um imunizante com poucas reações adversas. A vacina foi testada em 1966 e aprovada em 1967, quatro anos depois do início da pesquisa.

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Mais tarde, Hilleman combinou a vacina da caxumba com outras duas que havia criado: rubéola e sarampo. A dose única você conhece bem: é a Tríplice Viral.

Legado

Ao longe de décadas de carreira, Hilleman trabalhou junto com grandes imunologistas, como Anthony Fauci, que esteve à frente das discussões nos EUA sobre políticas de combate ao vírus da covid.

Seus colegas de trabalho o descreviam como alguém duro e, por vezes, difícil de se relacionar. Mas ao mesmo tempo leal e devotado à ciência. Era um “adorável rabugento”, segundo Fauci. Suas filhas dizem que ele estava sempre trabalhando, mas que isso não o impediu de ser um pai atencioso.

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Hilleman se aposentou da MSD nos anos 1980, mas seguiu pesquisando sobre vacinas e dando aulas na Universidade da Pensilvânia, além de atuar como consultor da Organização Mundial da Saúde. Em 1988, ele recebeu do presidente Ronald Reagan a Medalha Nacional de Ciência, a maior honraria que um pesquisador pode receber no país.

Maurice morreu em 11 de abril de 2005, aos 85 anos. Hoje, uma bolsa leva o seu nome na Universidade Estadual de Montana, onde se graduou.

Um dos maiores vacinologistas de todos os tempos teve uma vida discreta, boa parte dela à frente do microscópio. E, assim, com um imunizante de cada vez, deixou um legado enorme para a humanidade.

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