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O criador da gente

Responsável pela animação digital de Matrix,George Borshukov diz que a técnica atingiu 99%do objetivo de recriar pessoas com perfeição.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h36 - Publicado em 30 nov 2003, 22h00

Heitor Shimizu

Se no filme MatriX o mundo em que vivemos é apenas um software criado por um computador, na vida real anda acontecendo exatamente a mesma coisa. Keanu Reeves é o ator principal da série de ficção-científica, mas em muitas das cenas em que aparece, ele nem sequer está lá. Tome como exemplo as lutas do personagem Neo (Reeves) contra as dezenas de agentes Smith (Hugo Weaving), em

Reloaded, ou o supersoco que põe na lona o adversário em Revolutions. São seqüências completamente produzidas em computador, em que os corpos e os rostos, com todos os seus detalhes, imperfeições, poros e fios de cabelo, são modelados e animados pela computação gráfica. Não apenas os atores e cenários são virtuais, mas até mesmo as câmeras.

Primeiros filmes a alcançarem sucesso na recriação de atores reais, os três Matrix representam uma gigantesca conquista no campo da animação digital. Um dos principais artistas e programadores responsáveis pela façanha é George Borshukov.

Nascido na Bulgária, o engenheiro Borshukov fez o mestrado em ciência da computação na Universidade da Califórnia, em Berkeley, Estados Unidos. Ali, desenvolveu com dois colegas uma revolucionária técnica de animação digital a partir de fofos. Os três fizeram um pequeno filme que mostrava uma seqüência aérea do campus, animada a partir da triangulação da informação visual obtida de imagens estáticas. Criaram modelos em 3-D dos prédios mas, no lugar de aplicar texturas e detalhes gerados por computador, empregaram as fofos dos próprios edifícios. O resultado, exibido numa feira de computação gráfica em 1997, chamou a atenção de John Gaeta, o supervisor de efeitos especiais de uma trilogia que, então, existia apenas na cabeça dos irmãos Wachowski. Gaeta contratou Borshukov na hora.

O resultado apareceu pela primeira vez nos cinemas dois anos depois, na seqüência que ficou conhecida como bullet time, em que Neo é visto sob vários ângulos desviando de balas em câmera ultralenta. O resto é história.

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Em novembro, poucos dias após a estréia mundial de Matrix Revolutions, Borshukov esteve no Brasil, como convidado do 2º Fórum de Efeitos Especiais, Animação e Computação Gráfica, organizado pela produtora Digital 21 para 300 profissionais da área. Após sua palestra, Borshukov concedeu a seguinte entrevista exclusiva à SUPER.

A luta de Neo contra os dezenas de agentes Smith foi feita totalmente em computador. Isso significa que a computação gráfica conseguiu, finalmente, recriar atores com perfeição?

Produzir um rosto realista sempre foi considerado o “cálice sagrado” da animação digital. Ainda não agarramos o cálice mas, com o trabalho que fizemos em Matrix, acredito que ao menos o tocamos. Conseguimos atingir 99% do necessário para recriar um rosto. Dizendo assim, parece que falta pouco, mas para alcançar esse 1% serão precisos pelo menos mais uns 20 anos.

O que há nesse 1%?

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Muita coisa. Para modelar a pele humana, por exemplo, é preciso entender o que há por baixo da superfície, de modo a poder recriar todas as camadas da epiderme, gordura, poros, pêlos e ainda todas as suas características físicas e até químicas. Precisamos reproduzir também as diversas maneiras como todas essas características interagem com luzes ou em situações diferentes. Para os 100%, seria necessário chegar até o nível microscópico, ao mais ínfimo detalhe, de forma a poder modelar até mesmo átomos e moléculas. Mas acredito que tudo isso seja desnecessário. Por que gastar tanto esforço, tempo e dinheiro para atingir a perfeição se ela, ao menos para o que fazemos neste momento, não é necessária? Com a tecnologia que desenvolvemos, aliada à mão do bom artista, conseguimos fazer algo suficientemente real.

Estamos chegando a um momento em que os atores serão dispensáveis?

Não creio. Alguns filmes foram feitos sem atores humanos. Ou melhor, eles foram utilizados como base para as cenas, na captura de imagens, e depois tratados no computador. Mas não aparecem na tela. De qualquer modo, esse tipo de filme não deu certo. Final Fantasy, que é muito bom, levou poucas pessoas ao cinema, ao contrário do esperado. Talvez as pessoas não estejam interessadas em filmes 100% digitais. Algumas delas sim, mas ai estamos falando de um público especializado. A maioria quer ver filmes que tenham atores talentosos, em grandes interpretações. A cinematografia virtual não pretende, de maneira nenhuma, substituir a cinematografia tradicional. Pessoalmente, não acredito em atores virtuais.

A cinematografia virtual é, então, mais uma ferramenta que uma arte?

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Eu a vejo como uma ferramenta para artistas muito talentosos, como os diretores Larry e Andy Wachowski (de Matrix). Eles tinham uma visão, sabiam exatamente o que queriam, e nós implementamos as ferramentas que tornaram possível tal visão. Não me vejo como artista, apesar de ter a capacidade de olhar para uma idéia e saber como torná-la real. A expressão artística pertence aos diretores e é com eles que deve ficar.

Que cenas de tirar o fôlego podemos esperar para os próximos anos?

Sinceramente, não sei. Tem havido uma grande tendência na animação digital nos últimos anos, infelizmente, de produzir coisas grandiosas no lugar de visões de qualidade. Sejam as centenas de agentes Smith espalhados pela tela, sejam os milhares de soldados em uma batalha de Guerra nas Estrelas. Tudo está ficando cada vez maior e isso não é, na minha opinião, para onde devemos avançar. Acredito que teríamos que privilegiar a qualidade e não a quantidade de coisas que vemos na tela. Estou mais interessado em explorar as possibilidades da computação gráfica em tomadas fotorrealísticas. Reproduzir o real e produzir um novo real, como nos closes das cenas do supersoco, em Revolutions. Mas a tendência maior parece ser mesmo do uso da animação digital para possibilitar cenas grandiosas. Então, continuaremos a ver muito disso no cinema.

Os efeitos especiais costumavam ser utilizados apenas por alguns tipos de filmes, mas agora parecem ter se tornado onipresentes. Por quê?

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Há muitas situações em que a computação gráfica pode ser utilizada para facilitar ou cortar custos de produção, mas o que vemos com freqüência cada vez maior são as visões extremas, as cenas fantásticas que fazem o espectador perder o fôlego. A demanda está tão grande que os efeitos especiais deixaram de ser um recurso para se transformar no próprio propósito de certas produções. Pessoalmente, prefiro filmes excelentes que utilizem os efeitos visuais como parte deles, e não coma motivo.

Que outras utilizações você vê para o animação digital a partir das técnicas conquistadas com Matrix?

O Exército americana montou um instituto para realizar simulações de combate com imagens ultra-realistas produzidas por animação digital. Por ser pacifista, isso não é algo em que esteja interessado. Gostaria de ver de que forma essas conquistas em computação gráfica podem ser empregadas em outros campos, como na medicina. Cirurgiões plásticos e seus pacientes, por exemplo, poderiam visualizar o exato resultado das cirurgias antes que elas aconteçam. Isso sim seria uma conquista fabulosa.

George Borshukov

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• Tem 30 anos e mora em São Francisco, Estados Unidos

• Como os personagens de Matrix, gosta de vestir roupas pretas

• No Brasil, adorou as praias do Rio de Janeiro, os restaurantes de São Paulo e a caipirinha

• Está produzindo os efeitos especiais de Mulher-Gato, filme estrelado por Hale Berry

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