Pesquisadores da Universidade de Toronto encontraram vírus de RNA dentro do Toxoplasma gondii, protozoário causador da toxoplasmose. Os autores suspeitam que o vírus possa acentuar a doença em humanos, mas isso ainda deve ser verificado em estudos futuros.
O meliante é o Apocryptovirus odysseus (e mais 18 vírus geneticamente próximos). Ele foi descoberto por meio de uma análise computacional de dados neurais de humanos. Em alguns indivíduos, os pesquisadores encontraram não só o T. gondii – já conhecido por se alojar no cérebro – mas também esses vírus. Da mesma forma que os coronavírus, o A. odysseus possui RNA como material genético.
A equipe usou uma plataforma chamada Serratus, que identifica vírus de RNA a partir de dados já publicados. Eles passaram por mais de 150 mil vírus para encontrar A. odysseus, que provavelmente infecta o T. gondii. A pesquisa foi publicada no periódico Virus Evolution.
Estima-se que 30% da população mundial esteja infectada pelo T. gondii. No Brasil, um estudo mostra que a prevalência pode chegar a 60% ou 70% das pessoas. O parasita costuma passar despercebido, porque só provoca sintomas em alguns casos – geralmente, pessoas com o sistema imunológico comprometido.
Ele infecta praticamente todos os animais de sangue quente, se alojando nos músculos ou cérebro na forma de cistos. O T. gondii pode ser transmitido por meio do consumo de carne e outros alimentos infectados; ou pelo contato com fezes de gatos e felinos, que são os únicos hospedeiros definitivos. Isso significa que o protozoário completa seu ciclo reprodutivo apenas nesses animais. Humanos são apenas hospedeiros intermediários.
“Acreditamos que o vírus e o protozoário trabalham juntos para causar a doença no hospedeiro humano, em que o vírus se esconde dentro do parasita, como um soldado em um Cavalo de Troia, para ter acesso ao cérebro humano”, diz Purav Gupta, aluno de graduação em bioinformática e primeiro autor do estudo, em comunicado. “Essa é a primeira vez que cientistas relacionam a toxoplasmose a um vírus”.
O A. odysseus foi encontrado em duas cepas do T. gondii, chamadas RUB e COUGAR. A primeira foi documentada na Guiana Francesa, com sintomas de febre e falência dos órgãos. Já a segunda é da Columbia Britânica (Canadá), e foi associada à toxoplasmose ocular, que leva à cegueira.
Essas cepas circulam em países diferentes e foram identificadas em momentos diferentes, mostrando a potencial abrangência do vírus. Outros vírus que infectam protozoários são conhecidos por desencadear respostas do sistema imune do hospedeiro humano. Por isso, os pesquisadores acreditam que o A. odysseus tenha ação inflamatória e acentue os sintomas da toxoplasmose.
“O próximo passo é testar a possibilidade de tratar o vírus do parasita, e se esse é um meio efetivo de tratar os sintomas que surgem da infecção”, diz Artem Babaian, professor assistente de genética molecular da faculdade de medicina da Universidade de Toronto, que participou do estudo.